diálogos jungianos
Ele: Ontem sonhei com você. Estou mal.
Ela: Ah é!?
Ele: Sonhei que estávamos em um restaurante. E você ficava olhando o tempo todo para um cara na outra mesa.
Ela: Olhos são para olhar.
Ele: Você flertava. Provocava ciúmes. Eu reclamava e você sequer desviava o olhar para me contradizer.
Ela: E por que está mal com isso?
Ele: Porque parece que você está interessada em outra pessoa.
Ela: Isso é só sua insegurança. Diz respeito tão somente a você.
Ele: Será? Não pode ser uma premonição de algo que está em vias de acontecer?
Ela: Você acredita mesmo que é vidente ou que um anjo estava lhe contando o futuro?
Ele: Não. Tudo bem. Você está certa. Não tem nada a ver.
Ela: Exatamente. Sonhos não devem passar de uma noite.
Ele: E que você sonhou esta noite?
Ela: Que eu estava em um avião que estava caindo.
Ele: Bizarro!
Ela: Viu… Precisamos conversar.
Ele: O que?
Ela: Eu conheci alguém…
diálogos lacanianos
Ela: O que você pensa de mim?
Ele: Xi! Tá buscando aprovação?
Ela: Você acha que eu sou uma pessoa boa?
Ele: Não. Ninguém é.
Ela: Você acha que eu sou uma pessoa ruim?
Ele: Certamente. Todos são.
Ela: E você? É uma pessoa ruim?
Ele: Segundo alguns, o pior. Provavelmente também para você daqui algum tempo.
Ela: E tem algo de errado comigo?
Ele: Você se apaixona por quem se comporta como sua mãe com você.
Ela: Como assim?
Ele: Amor condicionado. Atenção, agressão e indiferença.
Ela: E você?
Ele: Eu me apaixono por você.
Ela: Por algum motivo especial?
Ele: Porque eu respondo as perguntas que você gosta de indagar.
Ela: E quanto tempo isso irá durar?
Ele: Até quando eu te der atenção, agressão e indiferença.
Ela: Então você está no controle?
Ele: Enquanto outro não te der algo mais intenso e abusivo.
Ela: Você é um abusador?
Ele: Todos somos. A natureza das relações é o gozo egoísta. Não existe altruísmo nesta história.
Ela: E o meu prazer é o abuso?
Ele: Liga não. O meu também é.
Ela: Eu abuso de você?
Ele: Sim. Por exemplo, eu detesto responder estas perguntas, mas eu me sujeito a isso porque é a maneira de te manter por perto.
Ela: E se eu parar de te indagar?
Ele: Você vai procurar outra pessoa pra fazer isso.
Ela: E se você parar de responder?
Ele: Eu já faço isso. A minha atenção só tem valor pra você se eu intercalo com momentos de agressão e indiferença.
Ela: Você faz isso por querer?
Ele: Assim como você, eu só quero gozar.
diálogos niilistas
Ele: Eu te amo!
Ela: Não. Você ama o que você acha que eu sou. Você ama a sua idealização de mim.
Ele: Eu te desejo!
Ela: Sim. Você ama o seu desejo.
Ele: Você nunca relaxa?
Ela: Com vodka.
Ele: Mas a angústia só é amortecida. Fica pior depois, não?
Ela: Foco na ressaca.
Ele: Antes você se preocupava comigo. Hoje você se preocupa com os pronomes do caso reto e se eu estou enganando você.
Ela: Prioridades linguísticas.
Ele: Você não me beija mais efusivamente.
Ela: Novamente: prioridades linguísticas.
Ele: Será que algum dia vamos nos ver novamente?
Ela: …
Ele: Sim ou não?
Ela: …
Ele: Adoro teu cinismo. Até parece que você tem paz de espírito.
Ela: Vai começar?
Ele: Não. Deixa quieto. Passar bem.
Ela: Não vá embora! Eu te amo!
Ele: …
diálogos possessivos
Ele: Eu fiz um feitiço para fazer você ficar interessada em mim.
Ela: Isso foi uma amarração?
Ele: Não. Chama-se adoçamento.
Ela: E não é a mesma coisa?
Ele: Adoçamento não carrega os aspectos negativos. Não afeta o seu livre-arbítrio.
Ela: Você acredita mesmo nisso?
Ele: Não, mas…
Ela: Você incutir uma mensagem subliminar no meu inconsciente não me afeta de uma maneira desleal?
Ele: Sim, mas a propaganda, por exemplo, também faz isso.
Ela: E a propaganda não é maléfica?
Ele: É o caminho que aproxima um produto a um consumidor.
Ela: No caso do adoçamento eu sou o produto ou a consumidora?
Ele: Você pode escolher sua posição.
Ela: Obrigada por me manipular simulando estar nas minhas mãos a decisão sobre as possibilidades.
Ele: De nada!?
Ela: (enrijece o dedo do meio em detrimento da contenção dos demais)
Ele: Se quiser, eu cancelo o adoçamento.
Ela: Não, não precisa. Sendo bem honesta, eu que fiz uma amarração para você antes (e retira de sua bolsa dois bonecos de pano com os rostos colados e bem amarrados com cipós).
Ele: Bruxaria é alma do negócio.
diálogos paranoicos
Ele: Li seus poemas. Você escreveu pra mim?
Ela: Não. Eu sequer te conheço.
Ele: Tem certeza?
Ela: Acho que você está ficando paranoico.
Ele: Parece que falam comigo e que narram nossas histórias.
Ela: Legal que pense assim, mas o que eu escrevo não tem a ver com fato algum.
Ele: Tudo bem.
(alguns dias depois)
Ele: Agora sim. Você escreveu pra mim. Eu sei quem você é.
Ela: Menino maluquinho, eu não escrevi pra você não.
Ele: Onde você mora?
Ela: Nazaré.
Ele: Mentira. Você mora aqui em Ribeirão Preto.
Ela: O que faço pra te convencer? Olha… esta é minha foto de agora. Este é meu vídeo na praia. Não sou quem você pensa que eu sou.
Ele: Mentira. Você pegou esses arquivos na internet. Está querendo me enganar.
Ela: Você precisa de um médico.
Ele: Eu preciso é de você, Karen!
Ela: Meu nome é Maria.
Ele: Ah tá… sei…
Ela: Pelamor… Bloqueado.
(alguns dias depois)
Ele com outro nome: Ahá! Eu sei quem você é!
(e ela desiste de publicar seus poemas na internet)
diálogos lacônicos
Ele: Podemos recomeçar.
Ela: Nada será como antes.
Ele: Então podemos começar outra coisa.
Ela: Mas os ecos do passados ressoarão.
Ele: Podemos estabelecer novos princípios e diretrizes.
Ela: Mas tudo não estará contaminado pelo que já foi?
Ele: Podemos tentar.
Ela: Por conveniência?
Ele: Por tesão e pretensão.
Ela: Só pretensão, você diz?
Ele: Ok. Vamos continuar em silêncio.
Ela: Mas eu gosto de conversar com você.
Ele: Isso basta?
Ela: Nunca bastará.
Ele: Podemos ser inconsequentes.
Ela: Vou pensar.
Ele: Aí já não é mais inconsequência.
Ela: Voltemos ao silêncio então.
(e Ela beija Ele de forma incandescente sem passado, presente ou descuido)
diálogos bélicos
Ela: Houve um momento em que eu te desejei morto.
Ele: Como assim?
Ela: Meu ódio era tanto que eu só conseguia enxergar justiça e vingança na tua aniquilação.
Ele: Eu não vou pedir perdão, pois ambos sabemos que isso não significa absolutamente nada.
Ela: Eu não clamo por perdão. Os tempos mudaram. Hoje eu te vejo apenas como uma forte gripe na minha existência.
Ele: Forte gripe?
Ela: Sim. Atormentou durante algum tempo e hoje eu só tenho memórias do sofrimento daquele período.
Ele: E agora? Não sente mais nada? Nem resquício de ódio ou amor?
Ela: Se eu for me gripar que seja com um novo vírus.
(Ele se enfurece, franzindo seus cornos e revidando)
Ele: Uma vez inoculado…
Ela: Agora já vacinada desta peste!
Ele: Por que você veio ter comigo? Apenas para me ofender?
Ela: Apesar da minha indiferença quase que constante, senti falta disto.
Ele: De falar comigo?
Ela: Não. De te provocar dor.